INSTITUTO JOHN GRAZ

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O espetáculo mutável de John Graz

Data: 28/01/2016 - Local: 

Viajar é reVer!

O espetáculo mutável de John Graz 

Em sua biografia, John Graz é um homem de boas maneiras. O homem de boas maneiras age por uma lei interna, bebe as águas da Fonte, faz fugir os malefícios, harmoniza o Olhar. Mensageiro modernista, este viajante suíço do século XX, remonta às mesmas curiosidade e expectativa que direcionaram artistas viajantes, aqui aportados no século anterior, onde “o mundo parecia renovar-se ali e regenerar-se…” (HOLANDA, Sergio Buarque) e quando cria-se a História brasileira, inebriada pelo sublime, aliado principal do pitoresco, palavra presente inclusive no títulos da obra de Rugendas e Debret, para indicar a variedade intensa do vocabulário visual da paisagem brasileira, em sua tríade terra, flora e fauna, atrelada ao fausto português; em detrimento dos aspectos culturais e sociais, representam sempre o assombro frente a uma queda d’água, intocada, ou as florestas, com suas plantas e emaranhados, de beleza imensa e desconhecida; frente a um mundo natural, onde “parecia-nos ter-se renovado o quadro da criação do mundo, diante dos nossos olhos” (Spix & Martius) o viajante artista cria o cenário, quase panorama, onde figuram atividades humanas; entre eles, o índio, selvagem por excia., é ser a ser salvo; ou ainda, é índio guerreiro, herói; paradoxal, mostra-se ser livre, que caça, pesca, convive com o assombro e o sublime do novo mundo.

No início do século XX, a língua falada no centro de São Paulo é o tupi; quando John Graz aqui chega, em 1920, o triunfo da linguagem modernista baseia-se na anulação do academicismo que o antecedera. Frente da energia futurista, como Oswald de Andrade o reverencia, ao adquirir-lhe uma das telas expostas na Semana de 22, e conclamá-lo meu artista futurista, John Graz traz em sua bagagem artística, a concepção modernista de arte, em especial, a paisagem, vivenciada na admiração por Ferdinand Hodler, mestre do modernismo suíço, que reduz seus horizontes a uma linha contínua, infinita, que perpassa a paisagem de um quadro a outro. Enquanto o próprio Oswald, Anita Malfatti, os Gomide, Brecheret, Tarsila, viajam à Europa, entusiasmados pelos -ismos diversos da vanguarda européia, John Graz faz o caminho inverso: cidadão do mundo, traz ao Brasil a visão modernista, apre(e)ndida em seus estudos acadêmicos e nas viagens, também de estudos, à Alemanha e Espanha.

O artista distancia-se do pitoresco tropical para uma recriação da paisagem e dos temas que a cercam; repórter de um país em ebulição, resgata na natureza generosa, o domínio do risco e do desenho, da cor e da pintura; ainda na esteira dos viajantes, John Graz torna-se um artista brasileiro por excia., domina o assombro pelo traço preciso, o sublime na pincelada econômica, a luminosidade generosa na cor certeira; e não desdenha seus personagens, mas os desenha sempre em ação, ora trabalhando em profissões regionais, ora orando aos deuses, ora divertindo-se nas festas populares; este espetáculo mutável, recorrente em viagens por outros países, diferencia-se nas especificidades da paisagem visitada. A paisagem só existe por que re(a)presentada.

A história natural, os fatos sociais não fazem parte de sua ambição; seus interesses, estéticos e técnicos, empenham-se em transmitir os caminhos do prazer de suas anotações bem humoradas, do trabalhar em cores amplas e brilhantes e distanciar-se da imagem fotográfica, mesmo quando usa suas fotografias, montadas em colagens contemporâneas. O resultado é uma reunião feliz de cenário, cultura, habitante.

Precursor do modernismo junto com Anita, Di Cavalcanti, Rego Monteiro e outros, John Graz dá-se a chance de estranhar o visto, revisto em sua trajetória de vida, e confirmar seus saberes, ao recriar um Brasil novo, de sabor moderno; não interpretar nada, mas Fazer! Sempre! – restabelecendo vínculos possíveis e perceptivos entre o representado e o representar: misto de passado e presente, com o Olhar voltado para o perene.

Assim, a sinceridade modernista de John Graz aparta-se dos efeitos seduzíveis, para, antropofagicamente, reconquistar um Brasil moderno, visível, Brasil brasileiro, representado a partir dos fatos reconhecíveis da produção artística, acadêmica ou não, reavaliada com o olhar da curiosidade e da aprendizagem (a inovação do fazer artístico implica na referência e estudo dos fazeres anteriores: História! Estória!) e atualizar este Olhar, em linguagem diferenciada e diferenciadora, na busca do essencial do trabalho artístico, no bom dizer de Ezra Pound: a novidade que permanece. Destarte, confirmam-se as boas maneiras do viajante John Graz.

sergiopizoli

curador